Até muito recentemente, os netos de portugueses necessitavam provar ligação a Portugal para obterem a nacionalidade portuguesa.
Assim, o que para alguns dificultou o acesso a este direito, para outros, tornou possível ser cidadão português. Visto que, os netos passam a ser portugueses originários.
Neste artigo, trataremos especificamente como você pode provar ligação a Portugal, nos termos da lei e do regulamento da nacionalidade portuguesa.
1. Lei da nacionalidade portuguesa – 2017
Com a alteração à lei da nacionalidade em 2017, os netos de portugueses passaram a ter o direito de requerer a nacionalidade portuguesa por atribuição – a chamada ‘nacionalidade originária’.
Assim, o pedido da nacionalidade passa a ser possível aos bisnetos e, sucessivamente, pelos demais descendentes de portugueses.
Sem dúvidas, esta foi uma alteração muito significativa para os lusodescendentes, que puderam resgatar o direito à nacionalidade portuguesa e ver sua identidade lusa reconhecida.
2. Obrigatoriedade de provar ligação a Portugal
No entanto, os netos de portugueses passaram a ter a obrigatoriedade de provar ligação a Portugal.
Por isso, muitos cidadãos lusodescendentes se viram embaralhados com esta alteração.
Mas, a boa notícia é que a lei deixa-nos pistas de como conseguir comprovar esta ligação.
3. Prova de ligação à comunidade portuguesa
Assim, a atribuição da nacionalidade portuguesa ao neto de cidadão português é atribuída pela verificação da existência de ligação à comunidade nacional.
No entanto, o reconhecimento destes laços caberá ao Governo português.
Desta forma, você precisa juntar todos os elementos que configuram seu conhecimento da língua portuguesa, uma vez que o ônus da prova é do requerente.
Como também, seus contatos regulares com o território português, conforme abordaremos a seguir:
3.1. Residência legal em território nacional
Antes de mais, você precisa ter um título de residência válido, emitido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – SEF, para que você seja considerado residente legal em Portugal,
Assim, se você é residente no território português nos três anos imediatamente anteriores ao pedido, e você:
- se encontre inscrito na administração Nacional de Saúde OU nos serviços regionais de saúde, E
- comprove frequência escolar em estabelecimento de ensino no território nacional OU demonstre conhecimento da língua portuguesa.
Nestes casos, o Governo reconhecerá automaticamente a sua ligação à comunidade nacional.
Todavia, quando você demonstrar residir legalmente no território português nos cinco anos imediatamente anteriores ao pedido, também haverá um reconhecimento pelo Governo.
Além disso, você deve estar inscrito na administração tributária E no Serviço Nacional de Saúde OU nos serviços regionais de saúde.
No entanto, se você é residente em Portugal, mas ainda não completou nenhum dos períodos mínimos de residência regular indicados na lei, cabe identificar outros meios de prova.
Cada processo é analisado de forma individual, por isso, o deferimento do pedido depende dos elementos que você apresentar.
3.2. A deslocação regular a Portugal
No que se refere à deslocação regular a Portugal, é importante que nos últimos cinco anos anteriores ao pedido, você tenha realizado viagens frequentes ao país.
Assim, você deve juntar cópias autenticadas e apostiladas das páginas do passaporte, designadamente das folhas onde constam os carimbos de entrada no país.
Caso o carimbo de entrada esteja ilegível, vale a pena juntar o bilhete de avião. Desta forma, qualquer dúvida quanto a data correta da viagem será logo esclarecida.
3.3. A propriedade ou contrato de arrendamento celebrado há mais de três anos
Quanto a este item, você deve comprovar ser proprietário de um imóvel, há mais de três anos, juntando a escritura pública do mesmo.
Se arrendatário de um imóvel, deverá apresentar o respetivo contrato de arrendamento, igualmente há mais de três anos.
3.4. A residência ou ligação a uma comunidade histórica portuguesa no estrangeiro
A comprovação da residência ou da ligação a uma comunidade histórica portuguesa no estrangeiro constitui um critério subjetivo, a ser decidido pelo Conservador.
Segundo a Secretaria-Geral do Ministério da Justiça:
“são comunidades de ascendência portuguesa as comunidades locais fora de Portugal, onde a maior parte dos membros é reconhecida e comprovadamente descendente de portugueses e pratica e divulga valores e tradições da cultura portuguesa de certas regiões do país.”
Como é de conhecimento geral, a Conservatória tem considerado como comunidades históricas portuguesas no estrangeiro, as comunidades localizadas nas cidades de Newark e New Jersey, nos EUA.
Lembrando que, a definição de ‘comunidade histórica’ não se refere especificamente a uma cidade, mas sim a uma comunidade.
Aliás, as referidas comunidades portuguesas da costa leste dos EUA é bem conhecida pelas suas atividades ativas e engajadas, que visam preservar a cultura e as tradições lusas.
Enquanto isso, no Brasil, muito se discutiu e ainda se discute se haveria comunidades históricas portuguesas, principalmente localizadas na cidade do Rio de Janeiro, cidade que no passado foi capital de Portugal.
No entanto, até o momento, nenhuma comunidade chegou a ser efetivamente considerada e reconhecida.
3.5. A participação regular ao longo dos últimos cinco na vida cultural da comunidade portuguesa do país onde resida
A participação regular na vida cultural da comunidade portuguesa do país onde você resida parece-nos uma via interessante para comprovar a sua ligação a Portugal.
Isto porque, através das associações, clubes, casas de Portugal e não só, você poderá comprovar a sua vivência na vida e na cultura portuguesa.
Por isso, é importante que você obtenha uma declaração da respetiva associação, devidamente certificada e apostilada.
Este documento deve declarar a sua participação regular e ativa na comunidade nos últimos cinco anos anteriores ao pedido.
4. Oposição à nacionalidade portuguesa pela falta de prova de ligação a Portugal
No caso de você ser notificado da ação intentada pelo Ministério Público em oposição à atribuição da sua nacionalidade portuguesa, você poderá contestar e reunir novas provas.
Nesta fase, você terá a possibilidade de discutir alguns dos critérios subjetivos que constam na lei, como por exemplo, a definição das comunidades consideradas históricas portuguesas.
Porém, tendo em vista que a alteração dos critérios de concessão da nacionalidade portuguesa aos netos é recente, ainda não existe jurisprudência formada nomeadamente sobre este assunto.
Importa referir que, se houver indeferimento do seu pedido, isso não inválida que você ingresse posteriormente com novo processo e apresente os requisitos em falta.
5. E os netos naturalizados pela lei anterior, podem requerer a nacionalidade originária e provar ligação a Portugal?
Sim, podem. Se você adquiriu a nacionalidade portuguesa nos termos da lei anterior, você poderá requerer a convolação da sua nacionalidade derivada para a nacionalidade originária.
Isto porque, convolar é a ação de mudar. Neste caso, designadamente averbar no seu assento de nascimento português a atribuição da nacionalidade portuguesa.
Com esta alteração, você dará a oportunidade ao seu filho, bisneto de português, requerer a nacionalidade originária.
Conforme já referirmos, esta foi uma das grandes novidades da lei, a qual possibilitou o acesso ao direito da nacionalidade portuguesa aos bisnetos.
No que se refere ao processo de convolação, segue-se os mesmos procedimentos do pedido da nacionalidade portuguesa aos netos, nos termos da lei atual.
Lembrando que, se você é cidadão português naturalizado, a comprovação da ligação efetiva à comunidade nacional já se encontra devidamente estabelecida.
6. Recente alteração à lei da nacionalidade portuguesa – 2020
Com a publicação da Lei Orgânica n.º 2/2020, de 10 de novembro de 2020, os netos de portugueses passam a comprovar a existência de laços de efetiva ligação à comunidade nacional pelo conhecimento suficiente da língua portuguesa.
Além disso, os netos não podem ter sido condenados, com trânsito em julgado da sentença, com pena de prisão igual ou superior a 3 anos, por crime punível segundo a lei portuguesa.
Também não podem apresentar perigo ou ameaça para a segurança ou defesa nacional, pelo envolvimento em atividades relacionadas com a prática do terrorismo, nos termos da lei.
Assim, devido a esta alteração tão aguardada, você que é neto, poderá finalmente declarar querer ser português.
*Nota: texto atualizado em 13/12/2020.
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(Vanessa C. Bueno)
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